segunda-feira, 15 de março de 2021

O não funcionamento do COMPAM gera déficit democrático, procedimental e qualitativo, irrecuperável, diz o STF

Reunião Ordinária do COMPAM, em 10.03.21, com a participação de integrantes do Fórum de Defesa da Democracia Ambiental (FDAM) conselheiros e não conselheiros.


Sem se reunir nos dois primeiros meses de 2021, o Conselho Municipal de Proteção Ambiental de Pelotas (COMPAM), órgão colegiado, deliberativo, fiscalizador e normativo, integrante do Sistema Nacional do Meio Ambiente - SISNAMA e instância superior para o estabelecimento da política ambiental do município realizou sua primeira reunião na semana passada, a qual tratou, na maior parte do tempo, aproximadamente uma hora e trinta minutos, de temas meios (organização) e, apenas um pouco mais de trinta e cinco minutos, para as atividades fins, no caso, proteção e impactos sobre os banhados, mas sem deliberar sobre o mesmo, cujo debate deve seguir nas próximas reuniões, visando a construção de uma politica ambiental para proteção das zonas úmidas, até então, inexistente.

A reunião de março só aconteceu em razão da iniciativa adotada por uma das entidades coordenadoras do COMPAM, o Instituto Pró-Pampa (IPPampa), tendo em vista que a Secretaria de Qualidade Ambiental (SQA), sua secretaria executiva e também integrante da atual Coordenação do COMPAM, juntamente com a Secretaria de Desenvolvimento, Turismo e Inovação (SDETI) e Centro de Industrias de Pelotas (CIPEL), não garantiu o suporte necessário para que as reuniões de janeiro e fevereiro ocorressem, ainda que a lei estabeleça a obrigatoriedade do Poder Executivo em reservar “recursos para as despesas de criação, manutenção e funcionamento” de tal colegiado ambiental.

Mas isso não vem ocorrendo dessa forma, ou seja, a democracia no COMPAM não vem sendo garantida.

No ano de 2020, o COMPAM ficou quase oito meses sem se reunir. Não houve, por parte da SQA, justificativa legal adequada para tal paralisia, que obstaculiza o direito de participação da sociedade civil na construção da politica ambiental, o que foi, na semana passada, considerado inconstitucional pelos ministros do STF, em julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), em razão do Decreto n. 9.806, de 28 de maio de 2019, editado pelo Presidente da República, que, ao dispor sobre regras de composição e funcionamento do Conselho Nacional do Meio Ambiente – CONAMA –, instituiu alterações no Decreto n. 99.274/1990 quanto à representação de seus membros e seu processo decisório e promoveu uma desfiguração que atentou contra a democracia ambiental nacional.

O Supremo Tribunal Federal (STF) destacou a relevância do papel do colegiado ambiental na “elaboração das políticas ambientais, com suas resoluções que atuam, em conjunto com a legislação primária, para construir o ‘desenho normativo de proteção e regulação do meio ambiente’” e que “ao conferir à coletividade o direito-dever de tutelar e preservar o meio ambiente ecologicamente equilibrado, a Constituição exigiu a participação popular na administração desse bem de uso comum e de interesse de toda a sociedade”.

O funcionamento do colegiado ambiental deve observar o modelo democrático constitucional, sendo assim contraria a Constituição regras que “obstaculizam, quando não impedem, as reais oportunidades de participação social na arena decisória ambiental, ocasionando um déficit democrático, procedimental e qualitativo, irrecuperável”, como vem ocorrendo no COMPAM.

Assim, tal decisão se aplica aos colegiados ambientais em geral, como o Conselho Estadual de Meio Ambiente (CONSEMA) e o COMPAM.

Ao não garantir o funcionamento do COMPAM, obrigação legal da SQA, a Constituição é violada, pois é gerado tal “déficit democrático, procedimental e qualitativo, irrecuperável”.

As reuniões do COMPAM devem ser mensais e públicas, conforme as regras de seu funcionamento, sendo de sua competência exclusiva “sem prejuízo de outras ações necessárias ao controle e proteção da qualidade ambiental do município:

I - Deliberar as diretrizes da política ambiental a ser executada pelo Poder Público Municipal, criando, quando necessário, os instrumentos imprescindíveis para a consecução dos seus objetivos;

II - Deliberar e gerenciar sobre a aplicação dos recursos do Fundo Municipal do Meio Ambiente, cujos critérios serão determinados em lei complementar;

III - Decidir, como última instância administrativa em grau de recurso, mediante prévio depósito, sobre multas e outras penalidades impostas pelo Poder Público Municipal;

IV - Analisar e aprovar ou não projetos de entidades, públicas ou particulares, objetivando a preservação ou a recuperação de recursos ambientais, afetados por processos de exploração predatória ou poluidora;

V - Homologar acordos visando a transformação de penalidades pecuniárias na obrigação de executar medidas que objetivem concretamente a proteção, preservação e recuperação ambiental;

VI - Exigir, no caso de omissão da autoridade competente, multas e outras penalidades, a pessoas físicas ou jurídicas que não cumpram as medidas necessárias a preservação ou recuperação dos inconvenientes ou danos causados ao meio ambiente;

VII - Elaborar seu regimento interno, no prazo máximo de 60 dias.

VIII - Indicar suspensão dos contratos celebrados entre os órgãos da administração direta ou indireta do município e pessoas físicas ou jurídicas causadoras de degradação ambiental.”

Há previsão de, no mínimo, duas reuniões extraordinárias do COMPAM, ainda para o primeiro semestre, visando recuperar o número de reuniões perdidas. Para as não ocorridas em 2020, ainda não há previsão de recuperação.

Disse o STF: “A moldura normativa a ser respeitada na organização procedimental dos Conselhos é antes uma garantia de contenção do poder do Estado frente à participação popular e à cidadania política, missão civilizatória que o constitucionalismo se propõe a cumprir. Não há falar, portanto, em intervenção desproporcional no espaço decisório do Poder Executivo.