Por Thiago Andrades e Antonio Soler
TODAS AS ÁRVORES SÃO IMUNES AO CORTE, ou seja, por regra,
não podem ser podadas e/ou derrubadas. O corte é exceção, justamente porque são
seres vivos, que tem direito à vida assegurado pela lei municipal e que
desempenham um papel fundamental para outros seres vivos, humanos e não
humanos.
Pelotas vem passando por momento de intenso de cortes de árvores
na zona urbana, seja no espaço publico ou em propriedade privada.
Foi assim no ano passado na Saldanha Marinho, no Largo de
Portugal; há poucas semanas, na Praça dos Enforcados, no conjunto Rua Brasil;
na semana passada foi na Z3; e, ontem (07.05.21), junto a um conhecido centro
de saúde privado na zona norte.
Vamos tratar de todos oportunamente, mas agora
abordaremos o caso da Z3, onde árvores nativas sadias da praça Olegário Costa foram
cortadas, ao que tudo indica, pela prefeitura.
No final de semana passado recebemos uma denúncia, via
mandato da vereadora Fernanda Miranda (PSOL), de que árvores nativas sadias
foram cortadas numa praça na Colônia de Pescadores Z3, lugar junto a banhados e
matas nativas, a beira da Laguna dos Patos, extremamente pitoresco e que é
muito visitado.
Ao verificarmos o fato no local, constatamos que se
tratavam de 5 árvores da espécie Schinus terebinthifolia, árvore nativa da América do Sul e do Rio
Grande do Sul, popularmente chamada de Aroeira-mansa.
Segundo relato de moradores, foi a prefeitura, órgão
encarregado de cuidar da arborização urbana, quem cortou as árvores sob o
argumento de “revitalização” da área verde.
Nada contra em revitalizar as áreas verdes existentes,
bem como implantação de novas, esse é um dos objetivos da luta ecológica, já
que Pelotas apresenta deficiência dessa importante “infraestrutura urbana” que,
entre outros benefícios, ajuda a melhorar a qualidade ambiental das cidades e/ou
evitar que ela seja pior.
A importância das árvores, além de poder ser sentida
quando passamos pelas ruas, avenidas e áreas verdes, esta cientificamente
comprovada por diversos estudos e pesquisas que destacam seus benefícios para o
ambiente e para a saúde humana, uma das razoes que motivou o movimento
ecológico a lutar e conquistar leis que protegem a arborização urbana.
Cada árvore ajuda a formar um “conjunto verde”, a
arborização urbana, patrimônio público, não somente de quem mora em frente a
praça, na rua ou no bairro onde as árvores estão plantadas, mas de toda a população.
Por isso, também, a lei municipal se preocupa em proteger esse bem público e
incumbe ao poder público cuidar da mesma, obrigação também de toda a população.
Para podar ou cortar uma árvore é necessário observar as leis
ambientais existentes. Também há o Conselho Municipal de Proteção Ambiental
(COMPAM), que analisa e decide sobre aspectos de politica de arborização
urbana, especialmente quando envolve corte de árvores nativas em áreas públicas,
como tem ocorrido, não só na Z3.
A Sociedade Brasileira de Arborização (SBAU) recomenda o
mínimo de 15 m²/habitante para áreas verdes públicas destinadas à recreação.
Pelotas tem tão somente 4m²/habitante, considerando TODAS AS ÁREAS VERDES (não
só as de lazer), conforme o Relatório Anual da Qualidade Ambiental (RAMB), de
2002. De lá pra cá (quase duas décadas, o tempo médio para uma árvore ficar
adulta e desempenhar a pleno suas funções ecológicas e, consequentemente,
sociais), esse índice possivelmente diminuiu, pois o governo municipal não
construiu uma politica capaz de qualificar e ampliar áreas verdes e a
arborização urbana e, assim, melhorar a saúde e qualidade de vida das pessoas.
A regra é que as árvores não podem ser cortadas: “são
imunes ao corte, não podendo ser derrubadas, podadas, removidas ou danificadas,
salvo nos casos expressos em lei”, os quais são somente três, onde é autorizada
poda e/ou corte de árvores em espaços públicos, como calçadas, canteiros
centrais e praças. Determina a lei ambiental:
I
- quando seu estado fitossanitário justificar;
II - nos casos de obstáculo fisicamente incontornável ao
acesso de veículos e não seja possível tecnicamente alternativa;
III - quando causar danos irreparáveis ao patrimônio
público ou privado e não seja possível tecnicamente alternativa.
Outras situações, apesar de desejadas por alguns que são
contra a arborização urbana, não encontram, base legal para derrubada ou poda
e, caso a ocorrência se der, será fora dos dois casos autorizados por lei. Além
de ser um ilícito administrativo sujeito a multa, também pode configurar
conduta punível com detenção de três meses a um ano, pela lei de crimes
ambientais.
Isso significa que o órgão responsável pela arborização
urbana, a Secretaria de Qualidade Ambiental (SQA), não pode fazer podas ou
colocar árvores abaixo? Não, isso quer dizer que a SQA pode e deve fazer o
manejo das árvores para garantir uma melhor qualidade de vida para os humanos e
também proteger a arborização urbana, nos limites da lei e não conforme a
vontade de algum agente público ou de munícipes, sendo permito, sim, o corte
e/ou derrubada, nos casos acima mencionados.
Historicamente, há um ataque a arborização urbana,
gerando um déficit arbóreo, o qur agrava a situação.
Rua General Osório, Pelotas/RS. 1940. Fonte: Pelotas Antiga.
Outro aspecto a ser considerado é que uma árvore adulta já esta cumprindo sua função ecológica e social e, uma árvore jovem, recém plantada, pode ou não se tornar uma árvore adulta, além do que, se conseguir vingar (em média, 40% da arborização urbana não consegue), ainda levará um tempo (media de 20 anos) para gerar os mesmos benefícios que uma árvore adulta já produz.
O corte de árvores em Pelotas tem violado diversos aspectos da lei e da democracia ambiental. No caso da Z3, ainda que a intenção (revitalização de área verde) se mostre extremamente necessária e positiva para/pela comunidade e mereça todo apoio, no seu método e mérito há questões, no mínimo, a serem esclarecidas. Podemos nos referir aos fatos e dizer: houve um déficit para a democracia ambiental, pois o COMPAM não se manifestou e também à qualidade de vida urbana, pois perdemos (toda população) árvores adultas nativas, que cumpriam funções ecológicas, com importantes benefícios sociais e não temos garantia de que isso será recuperado.
Z3. Foto: Thiago Andrades
Outro argumento posto nas redes sociais se referiu a ser
melhor para as crianças. Bom, se se referem à sombra, somente para as crianças
que nascerão em 2035 e quem viver ate lá poderá fluir desse beneficio.
Apesar de algumas pessoas, também nas redes sociais,
mencionarem que será realizado o plantio de outras árvores no local, isso é uma
exigência legal, uma obrigação e não um favor de quem corta e menos ainda se
trata de autorização automática para o corte, ao contrario, é uma penalidade da
lei.
É legalmente assegurada à comunidade, não só saber, mas
também decidir sobre as medidas que lhes atingem. Por isso é importante, não só
pelo respeito ao patrimônio público (áreas verdes são do interesse do conjunto
da população), mas também às pessoas, debater tais medidas drásticas antes da sua
execução, não só para esclarecer todos/as (sobre os riscos que ofereciam e qual
profissional legalmente capacitado atestou tal existência), mas também preparar
a comunidade e até, se for o caso, ajustar o projeto. Por isso também um
Conselho com atribuições legais para tratar disso.
Outros benefícios decorrentes da arborização urbana:
- Fornecem abrigo para a avifauna local;
- Aumentam a umidade do ar;
- Atenua a troca de temperatura e diminuem o calor,
propiciando conforto térmico;
- Diminui a poluição do ar, retendo partículas. Uma
árvore na porta de sua casa pode diminuir em até 50% a concentração de
particulados. A exposição a particulados urbanos esta associado a doenças
cardiovascular, pulmonar e reprodutiva;
- São barreiras para a poluição sonora (diminuem ruídos);
- Diminuem a erosão do solo.”
- Ampliam as áreas permeáveis do solo, contribuindo para
diminuir as enchentes da cidade;
- Embelezam as paisagens;
Supressão/corte de árvores, além de ser a morte (arboricídio)
de um ser vivo, que tem direito a vida, não gera só prejuízos ambientais, mas
também sociais, para as pessoas.
Acontece que não se faz revitalização acabando com vidas,
matando árvores. Ai se “mortaliza”! Revitalizar e dar vida novamente e cortar árvores
é matar.
Assim, os cortes somente são possíveis nos casos legais,
que são exclusivamente dois, conforme citados acima, cabendo garantir tal
observância a SQA, conforme nosso sistema constitucional que também obriga à
sociedade civil agir na proteção do ambiente.
Algumas providencias foram tomadas, como esclarecimentos
juntos a SQA, assim como relato do caso ao COMPAM e ao Ministério Público (MP)
e outros órgãos de controle.
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