quarta-feira, 3 de abril de 2024

Com Censura à fala, SQA e apoiadores aprovam retrocessos ambientais no COMPAM

 


Ocorreu ontem, 01.04.24, a Reunião Ordinária (RO) do Conselho Municipal de Proteção Ambietal (COMPAM), instancia máxima da política ambiental local, a qual foi presidida pela Secretaria Municipal de Qualidade Ambiental (SQA), com a seguinte pauta:

1. Informes;

2. Discussão e votação da Ata da reunião anterior;

3. Leitura do expediente;

a. Apresentação da minuta e votação de alterações da Lei Municipal 6306/2015;

b. Apresentação da SQA sobre aplicabilidade do Bioma Mata Atlântica;

c. Homologação dos processos julgados pela Câmara Temática;

d. Permanente de Recursos de Infrações Ambientais, Podas e Supressões do COMPAM (CTPRIA);

4. Discussão e votação da matéria ou processo em pauta.

Os retrocessos são notadamente com relação às regras do licenciamento ambiental (Lei Municipal 6306/2015 que dispõe sobre a Anuência Ambiental Municipal), tendo em vista minuta de Projeto de Lei (PL) proposto pelo governo municipal, sob o falso pretexto que alguns pontos da lei atuam necessitam ser alterados, como por exemplo os prazos das licenças ambientais, a fim de facilitar o trabalho da SQA, bem como os interesses de quem busca licenciamento de obras e atividades que geram impacto ambiental (geram poluição). Por exemplo, a Autorização Ambiental (AA), que hoje é de 1 (um) ano, caso o PL do governo seja aprovado, passará a ser de 5 (cinco) anos e a Licença Ambiental Prévia (LAP), que hoje é de 2 (dois) anos, passará também a ser de 5 (cinco) anos.

Os argumentos da SQA para fazer retroceder a lei ambiental não se sustentam técnica e legalmente. Alargar o prazo das licenças é muito bom para o empreendedor (poluidor, que gera impacto ambiental e social negativo), notadamente setores especulativos do mercado, pois diminui os custos junto ao órgão licenciador. Mas, para a sociedade e o ambiente, é extremamente prejudicial, pois diminui a capacidade do órgão licenciador de monitorar e fiscalizar tais obras e atividades, reduzindo também as possibilidades de evitar danos ambientas e sociais, ferindo diversos Princípios do Direito Ambiental, como o da Prevenção, o que se configura numa inconstitucionalidade.

Outra proposta de retrocesso na legislação ambiental, é a obrigatoriedade de parecer da Comissão Técnica de Anuência Ambiental (CTAA) previamente à diversas deliberações que cabe exclusivamente ao COMPAM. O governo pretende trocar, no texto da lei em vigência, o verbo “poderá” pelo “deverá”. Destacamos que a CTAA é composta exclusivamente pelo poder público, cujos membros são nomeados pelo secretário da SQA, não havendo garantia de que sejam técnicos e não cargos em comissão, nem controle social e muito menos transparência, um dos motivos pelosquais o Centro de Estudos Ambientais (CEA) manifesta sua contrariedade.

Discussão e deliberação sobre do Art. 5º e seus incisos do PL (alargar os prazos das anuências ambientais). A proposta da SQA é ampliar os prazos das anuências ambientais para 5 (anos), sem direito à renovação. Já a representante da Ordem do Advogados do Brasil (OAB) propôs um prazo de 2 (dois) anos, prorrogáveis por mais 2 (dois). A proposta da SQA obteve 8 (oito) votos; a da OAB 6 (seis) votos e 1 (uma) abstenção.

Discussão e deliberação sobre os textos dos artigos 5ª, §2º; 13, parágrafo único; 14, §1º; 15, § 1º; 21, parágrafo único; 32, parágrafo único; e 34, parágrafo único do PL. A proposta da SQA é de que seus pareceres passem a ser obrigatórios nas diversas hipóteses previstas na Lei 6.360/2014. A OAB apresentou proposta de manutenção do texto original onde tal parecer da CTAA é facultativo, cabendo ao COMPAM solicitar nos casos que entenda ser necessário. Colocada em votação, a proposta da SQA obteve 4 (quatro) votos e a da OAB obteve 11 (onze) votos.

Discussão e deliberação do art. 17, I do PL. Proposta da SQA: inclusão, na equipe técnica responsável pelo licenciamento, fiscalização e controle ambiental, um profissional da área da geologia. A OAB apresentou proposta para a inclusão também de advogado, mas a retirou, tendo em vista argumentos postos pela SQA.

Discussão e deliberação do art. 25, IX do PL. A proposta da SQA pretende que os recursos de deferimento ou indeferimento de licenças sejam, obrigatoriamente, encaminhados primeiramente para CTAA. A OAB apresentou outra proposta, na qual o parecer só seria necessário caso o recorrente assim solicitasse. A SQA se manifestou pela retirada da sua proposta. Porém, a mesa dos trabalhos defendeu a não retirada da mesma, mas apenas o caráter de obrigatoriedade. Assim foi aprovado.

O CEA entende que o PL do governo diminui ainda mais a capacidade (poder) do COMPAM, já debilitado, de incidir sobre a política ambiental local, substituindo-o, em algumas situações (assim como já fez com o Pontal da Barra, arborização urbana, mudanças climáticas e a Educação Ambiental, por exemplo) pela Comissão Técnica de Anuência Ambiental – CTAA (que é submetida hierarquicamente ao secretário da SQA) e também pelo próprio secretário da SQA, que passa ter a última palavra em termos de recursos de licenciamento ambiental, concentrando super poderes, transformando-o numa espécie de “imperador do licenciamento ambiental”, pois o mesmo terá poder de decidir ignorando a técnica e a lei, desprezando pareceres exarados pela própria CTAA e do COMPAM “avocando para si a responsabilidade de tal decisão”, o que é inequivocamente inconstitucional.



Se trata de um brutal retrocesso, que havia sido banido da legislação ambiental municipal em 1994, quando o COMPAM foi reestruturado, o qual deixará de decidir em último grau de recurso, de forma transparente e colegiada, para que isto seja feito de forma monocrática, ou seja, por uma só pessoa: o secretário da SQA, não só diminuindo a democracia, mas por outro lado aumentando as possibilidades de corrupção e de desvio de finalidade.

Também se iniciou a apresentação, por parte da SQA, quase dois anos após o requerimento do CEA, sobre aplicabilidade da Lei da Mata Atlântica em Pelotas, principalmente nas áreas demarcadas pelo mapa elaborado pelo IBGE, o qual indica as Florestas Estacionais Deciduais no Estado do Rio Grande do Sul. A SQA tem atribuição de licenciar obras e atividades nessas áreas, devido um convênio com a FEPAM. Este ponto seguirá na pauta da próxima RO, em maio. O CEA lembrou aos presentes que encaminhou à SQA, em 27 de maio de 2022, o Ofício 13/2022, requerendo acesso aos termos do convênio celebrado entre a FEPAM e a SQA para a realização do licenciamento nas áreas de Mata Atlântica e que, até a presente data, não foi respondido, ou seja, mais um claro desrespeito ao direito de acesso a informação ambiental.

Mais autoritarismo da SQA e apoiadores. O membro (não conselheiro) do CEA (entidade conselheira do COMPAM e também do CONAMA), Daniel Melo Barreto, solicitou a palavra, como de costume, com base no art. 15 do Regimento Interno do COMPAM e na lei vigente, para colaborar com as discussões, tendo em vista o seu conhecimento e experiência pessoal e do CEA em vários conselhos de políticas públicas Contudo, de forma autoritária e antirregimental, a fala foi negada pela coordenação da RO, semelhante ao que já o fizera em outros momentos, como com a representação da UFPel, tratamento que não se dá a consultores ambientais, empreendedores (poluidores) e/ou autuados que buscam o Conselho, o que representa uma parcialidade incabível.

Lembramos que o CEA é uma ONG com mais de 40 anos de atuação, colaborando em diversos momentos com a construção da política ambiental, como a reestruturação do COMPAM (década de 90) e a criação da SQA (década de 2000), e que vem realizando, como sempre o fez, um mandato critico, mas em prol da proteção ambiental, defendendo as reivindicações do FDAM junto ao COMPAM, o que, certamente contraria interesses de poluidores, infratores e criminosos ambientais.

A atual Coordenação do COMPAM é composta pela Secretaria de Qualidade Ambiental (SQA), Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Sindicato da Indústria de Arroz de Pelotas (SINDAPel) e Associação Comercial de Pelotas (ACPel).



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