O acesso a
informação ambiental, um dos princípios formadores do Direito Ambiental, é também
um direito de todos/as, consagrado no ordenamento jurídico ambiental
brasileiro.
Segundo a Lei
da Politica Nacional de Educação Ambiental e a Lei da Politica Estadual de
Educação Ambiental a “garantia de democratização das informações ambientais” é
um objetivo fundamental da educação ambiental, sendo aquela condição para esta.
E, sem informação e educação ambiental a participação popular fica restringida
ou até mesmo inviabilizada.
Em Pelotas, a luta ecológica reivindicou
o direito do acesso a informação ambiental, conquistando a Lei Municipal
3.863/94, que dispôs sobre a realização de Relatório Anual da Qualidade
Ambiental do Município de Pelotas (RAMB). Tal regra antecede a lei federal
(2003) e a lei estadual do RS (2008) sobre o tema.
O RAMB deve apresentar
os conteúdos mínimos de interesse ambiental e a Secretaria de Qualidade
Ambiental (SQA) o deve produzir, em conjunto com o Conselho Municipal de
Proteção Ambiental (COMPAM) para que as organizações não governamentais (ONGs),
as instituições de ensino, os órgãos ambientais e a sociedade em geral tenham
acesso a informação ambiental, como uma possibilidade para conscientização sobre
a qualidade do meio na qual estão inseridos/as, viabilizando uma participação
na gestão pública ambiental em condições para tal, pois não é possível opinar
e/ou decidir sobre o que se desconhece.
Assim, a lei citada
determina que o RAMB deve apresentar informações sobre a “situação ambiental do
município”, contendo no mínimo:
I - relação das atividades
realizadas pelo órgão municipal ambiental, de forma detalhada, como por exemplo
projeto, autorizações, licenças, multas, gastos, estudos, planos, seminários,
bem como qualquer outra efetuada;
II - relação das unidades de
conservação situadas no município e suas condições;
III - a situação da
vegetação nativa e flora do município, bem como das podas efetuadas de forma
legal e ilegalmente;
IV - sobre a coleta,
transporte, manuseio e destino final dos resíduos domiciliares, industriais,
hospitalares e outros;
V - sobre as condições dos
recursos hídricos do município, incluindo estudos sobre a balneabilidade ou não
dos mesmos, nos termos da legislação federal;
VI - sobre a poluição
atmosférica;
VII - sobre as obras e
atividades efetivas ou potencialmente poluidoras;
VIII - sobre o sistema de
tratamento de esgoto cloacal do município;
IX - um diagnóstico com as
características dos ecossistema locais, demostrando como eram, qual a situação
atual e as possíveis alterações;
X - bem como todas as demais
necessárias ao cumprimento desta Lei, sem prejuízo das estabelecidas pelo
conselho disposto no artigo 273, da Lei Orgânica Municipal.”
Acontece que a SQA, vem
descumprindo descaradamente a lei do RAMB, deixando de elaborá-lo sem motivação
e/ou fundamentação, em que pese as diversas tentativas do Centro de Estudos Ambientais
(CEA) e de outros conselheiros e conselheiras do COMPAM (como consta na Ata
Reunião Extraordinária de 19.03.2012) em reverter tal afronta a lei ambiental e
a esse direito da coletividade.
Tal omissão levou a um vazio
na política ambiental municipal, privando a sociedade civil de conhecer sobre a
qualidade ambiental, o que, por consequência, levou a uma impossibilidade de
participar da gestão ambiental, configurando, também, um ataque à educação
ambiental, assegurada na Constituição Federal e em outros diplomas legais como
a própria Lei da PNEA e a Lei da Politica Estadual de Educação Ambiental, já
citadas.
Deixar de publicar o RAMB já
seria muito grave para a politica ambiental. Mas não é só boicotando o RAMB que
a SQA sonegou e sonega a informação. Ela também desrespeita tal direito ao não dar
publicidade adequada dos seus atos e a documentos elaborados, bem como aos do
COMPAM, uma vez que cabe a ela tal medida por força de lei.
Existem inúmeros outros
exemplos. O sitio eletrônico da SQA não é devidamente atualizado e nem tão
pouco reflete a variedade de atribuições e serviços prestados pela SQA aos
cidadãos bem como aqueles voltados para proteção ambiental. Não é de
conhecimento público os Termos de Ajustamento de Conduta (TACs), Termos de
Compromisso Ambiental (TCAs) e/ou medidas compensatórias ou mitigatórias
estabelecidas pela SQA, nem como elas são determinadas e nem a quem são dirigidas
ou quem tem obrigação de cumpri-las. No sitio eletrônico da SQA também não
constam informações atualizadas sobre o uso dos recursos do Fundo Municipal de
Proteção e Recuperação Ambiental (FMAM) - http://ongcea.blogspot.com/2020/11/fundo-ambiental-boicotado-e-zerado.html.
Entendendo que foge da
legalidade o governo que não informa, informa parcialmente ou de maneira não
clara sobre atos e/ou matérias ambientais relativas às suas atribuições e que o
fortalecimento da democracia e da transparência da/na politica ambiental
reclama a implantação e a divulgação de medidas e mecanismos que assegurem a
informação ambiental ao público em geral, de forma regular, sem a dependência
de provocação previa de eventuais interessados, o CEA, após varias tentativas
insuficientes juntos a SQA e ao COMPAM, em 2015, apresentou uma representação
ao MP para garantir o acesso público às informações ambientais, tendo por objeto:
a) a observância da lei que
dispõe sobre a realização do RAMB;
b) a publicização dos atos
administrativos da SQA e do COMPAM, com adequada anterioridade quando sua
substancia assim exigir, seja através de meios digitais (como a página
eletrônica da Prefeitura Municipal ou a criação de página própria) e físicos
(como a imprensa local) relativa as suas atribuições;
c) maior
transparência no processo de licenciamento ambiental, já a busca de informações
pelo Sistema de Licenciamento Ambiental (SISLAN) exige o conhecimento prévio de
dados processuais indisponíveis ao público (http://ongcea.eco.br/?p=20843);
d) divulgação
dos Termos de Ajustamento de Conduta (TACs), Termos de Compromisso Ambiental
(TCAs) e/ou medidas compensatórias ou mitigatórias estabelecidas pela SQA;
e) divulgação da movimentação dos
recursos que dão entrada e saída do FMAM.
Após tal ação, a SQA alterou a configuração
do site, mas que continua impreciso e incompleto e desatualizado.
Sobre o RAMB, após um ano (2016)
deixando de atender a lei e agora também aos ofícios do MP, a SQA acabou por
publicar um RAMB em 2017 e outro em 2019, mas não explicou porque deixou de
fazer outras 13 vezes. Sim, o grupo político que esta na SQA desde 2005, dos 16
RAMBs que deveriar publicar, só o fez em três oportunidades. Uma ainda em 2006,
quando o CEA teve sucesso de sua reivindicação via COMPAM e outras duas vezes
(2017 e 2019), após nossa representação ao MP.
Mas mesmo assim, o conteúdo dos
RAMB publicados não atendei o mínimo que a lei determina, como:
- desrespeito ao prazo final
para publicação, todo ano em 05.06, no Dia Mundial do Meio Ambiente;
- publicação, de forma
resumida, em periódico de grande circulação local;
- envio de duas cópias às ONGs
cadastradas no COMPAM;
- elaboração em conjunto com
o COMPAM?
A SQA também não esclareceu
quais são as medidas adotadas (se é que foram) para evitar o descumprimento da
Lei do RAMB para o próximo ano.
Das demais questões representadas
ao MP, aguardamos encaminhamentos.
A seguir tabela que compara
prefeitos x secretários x publicação do RAMB, desde a criação a SQA, em 2001.
Note-se que desde então ocuparam a pasta 10 secretários, todos homens. A metade
(cinco) advogados. Do grupo que esta no poder há 16 anos, e que publicou 3 (2
somente após representação do CEA ao MP, em 2015) dos 16 RAMBs devidos, Fetter
e Leite foram os que mais trocaram secretários. Cada um contou com três secretários
diferentes. Paula contou com dois secretários e Bernardo com um. O prefeito que
publicou o RAMB foi o Bernardo (1 RAMB) e a Prefeita foi a Paula (2 RAMBs), mas
somente após o MP agir por provocação do CEA. A troca seguida de titular da
pasta contraria um trabalho eficaz e pode indicar o uso da SQA para ajustes políticos
e não para seu fim: proteção ambiental, o que pode explicar, em grande parte, a
precariedade da politica ambiental atualmente.
Prefeito |
Secretario
|
Profissão |
Período |
RAMB |
Fernando
Marroni (PT) |
Alexandre
Melo Soares (PT) |
Advogado |
2001 a
2004 |
2000/2001,
2002 e 2003 |
Bernardo
de Souza (PPS) 1º de janeiro de 2005 a junho de 2006 |
Leonardo
Martins Cardoso (PTB) |
Veterinário |
2005 a julho
de 2008 |
2006 |
Fetter
Junior (PP) junho de 2006 a 31 de dezembro de 2008 (vice) e 1º de janeiro de
2009 a 31 de dezembro de 2012 |
Mateus Lopes da Silva (PTB) |
Advogado |
Julho
de 2008 a 2011 |
NÃO
PUBLICOU |
Fetter Junior (PP) 1º de janeiro de 2009 a 31 de
dezembro de 2012 |
Luís Henrique Viana (PSDB) |
Advogado |
Fev 2011 a 2012 |
NÃO PUBLICOU |
Fetter Junior (PP) 1º de janeiro de 2009 a 31 de
dezembro de 2012 |
Paulo Morales (PSDB) |
Engenheiro
Civil |
2012 |
NÃO PUBLICOU |
Eduardo
Leite (PSDB) 1º de janeiro de 2013 a 31 de dezembro de 2016 |
Neiff
Satte Alam (PDT) |
Biólogo |
2013 a
julho de 2014 |
NÃO
PUBLICOU |
Eduardo
Leite (PSDB) 1º de janeiro de 2013 a 31 de dezembro de 2016 |
Luiz
Fernando Van Der Laan (PSDB) |
Engenheiro
Civil e Agrícola |
julho
de 2014 a abril de 2015 |
NÃO
PUBLICOU |
Eduardo
Leite (PSDB) 1º de janeiro de 2013 a 31 de dezembro de 2016 |
Fabricio
Tavares (PTB, PSD e PP) |
Advogado
|
abril
de 2015 a abril de 2016 |
NÃO
PUBLICOU |
Paula
Mascarenhas (PSDB) 1º de janeiro de 2017 a 31 de dezembro de 2020 |
Felipe
Perez de Garcia Fernandez (PSD) |
Empresário |
abril
de 2016 a outubro 2020 |
2016 e 2018 |
Paula Mascarenhas (PSDB) |
Eduardo Daudt Schaefer (PPS) |
Advogado |
outubro
de 2020 |
Prazo
em andamento |
Uma das questões que merecem
respostas é como será reparado o dano a sociedade que teve seu direito a
informação ambiental violado nesses anos todos?
E uma conclusão possível: o
retrocesso ambiental provocado pelo grupo político que domina a SQA há 16 anos
também foi feito pela sonegação da informação ambiental.
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