Desde que foi restruturado por força da Constituição
Federal de 88, em 1994, são de dois anos o mandato das entidades conselheiras
do Conselho Municipal de Proteção Ambiental de Pelotas (COMPAM), órgão
colegiado, deliberativo, fiscalizador e normativo, integrante do Sistema
Nacional do Meio Ambiente - SISNAMA e instância superior para o estabelecimento
da política ambiental do município, como diz a lei ambiental.
Durante o transcorrer do atual mandato, o qual se encerra
em junho de 2021 e iniciou em junho de 2019, com a exclusão indevida de
entidades como a EMBRAPA, o CEA e o CRBio, deveriam ser realizadas 24 reuniões
ordinárias do plenário, uma por mês, sem considerar as de suas Câmaras
Técnicas, que devem dar apoio técnico e politico as decisões de tal parlamento
ambiental, incluindo o Conselho Gestor do Fundo Municipal de Proteção e
Recuperação Ambiental (FMAM), o qual “tem por objetivo desenvolver projetos que
visem o uso sustentável do ambiente, a melhoria, manutenção ou recuperação
ambiental, com o escopo de atingir e manter uma sadia qualidade de vida para a
coletividade, conforme estabelece a Constituição Federal.”
Contudo, das 22 reuniões ordinárias que já deveriam ter
sido realizadas, somente 10 aconteceram até o presente momento. Caso sejam
realizadas somente as 2 ultimas reuniões ordinárias restantes, sem que aconteça
nenhuma reunião extraordinária, o mandato em curso deixará de realizar nada
mais, nada menos que quase a metade do numero de reuniões ordinárias, devido
legalmente.
Dito em outras palavras, na pratica, é como se o atual
mandato tivesse sofrido uma cassação arbitraria e ilegal da metade do tempo
legal, o que viola frontalmente o direito/dever constitucional da coletividade
em defender o ambiente, conforme esta posto na doutrina jurídica ambiental
dominante, nas leis vigentes e nos entendimentos dos tribunais superiores,
notadamente através das decisões retiradas do Supremo Tribunal Federal (STF) e
o Superior Tribunal de Justiça (STJ):
“Ao conferir à coletividade o direito-dever de tutelar e
preservar o meio ambiente ecologicamente equilibrado, a Constituição exigiu a participação popular na administração desse
bem de uso comum e de interesse de toda a sociedade. E assim o fez
tomando em conta duas razões normativas. A primeira consiste na dimensão
objetiva do direito fundamental ao meio ambiente. A segunda relaciona-se com o
projeto constitucional de democracia participativa na governança ambiental”
(grifo nosso)
Tal inaceitável corte pela metade das reuniões ordinárias
do COMPAM, não só fragiliza a democracia ambiental, pois afasta das decisões o
órgão colegiado que deveria decidir sobre a politica ambiental, gerando um
grande prejuízo para a qualidade dos ecossistemas locais, das pessoas e da vida
que deles dependem, mas, sobretudo, faz com que a definição sobre a politica
ambiental seja tomada em outros espaços, não necessariamente legítimos e legais
e, o que é pior, sem o conhecimento e participação da sociedade, como exige a
Constituição e os acordos internacionais ambiental das quais o Brasil é
signatário.
Ou seja, atualmente, a democracia no COMPAM é muita mais
formal, do que efetiva, material. E isso é antirregimental, ilegal e inconstitucional!!!!
Mas o número de reuniões devidas e não realizadas não é o
único indicador de que a democracia efetiva não se dá no COMPAM na medida legal
devida.
Outro aspecto extremamente relevante, que também demonstra
a ausência de democracia efetiva no COMPAM, diz respeito as suas deliberações,
ou melhor dizendo, a ausência delas.
Em 2019, 6 Resoluções foram aprovadas e publicadas.
Também foi publicada, de forma injustificadamente tardia, uma Resolução dita
aprovada em 2016, objeto de controvérsia e discussão de legitimidade. Nenhuma
resolução foi publicada e/ou aprovada em 2020 e nenhuma resolução foi publicada
e/ou aprovada em 2021. A situação ainda se agrava porque todas essas 7
Resoluções tratam estritamente de questões meios, administrativas,
organizacionais, ou seja, nenhuma se debruça sobre a finalidade da Secretaria Municipal de Qualidade Ambiental (SQA)
e do COMPAM, qual seja, a defesa constitucional do meio ambiente ecologicamente
equilibrado.
Ou seja, o COMPAM esta decidindo pouco e, o pouco que decide,
não diz respeito a proteção ambiental, sua finalidade legal.
Inevitáveis as seguintes perguntas: quem ou quais
instituições e/ou grupos de interesse esta/ão decidindo a politica ambiental
com a SQA? Onde? Com qual finalidade?
Lembramos que a SQA, órgão
da administração direta do Município, tem por finalidade atuar “como órgão
central de proteção, fiscalização e licenciamento ambiental, observando a
legislação ambiental e diretrizes estabelecidas pelo Conselho Municipal de
Proteção Ambiental – COMPAM” e que, “para assegurar a proteção,
preservação e melhorias da qualidade de vida do município”, cabe ao COMPAM:
“I - Fiscalizar o Poder Público da execução da política
ambiental em Pelotas;
(...);
VI - Promover o intercâmbio entre entidades ligadas a
proteção, preservação e recuperação ambiental;” (incisos I e VI, do art 5º, da
Lei 3835/94).
Essas obrigações legais, tanto da SQA como do COMPAM,
estão sendo prejudicadas e, por consequência, a atribuição do munícipio em
promover o licenciamento ambiental também esta sob risco legal, podendo levar a
uma insegurança jurídica.
O STF, em recente discussão sobre a democracia no CONAMA entendeu
ser
“inequívoco que
a lesão ou ameaça aos preceitos fundamentais da participação popular direta
(art. 1º, parágrafo único, CRFB), da proibição do retrocesso institucional e
socioambiental (art.1º, caput e inciso III; art. 5º, inciso XXXVI e § 1º; e
art. 60, § 4º, IV, CRFB), da igualdade em sua dimensão política e procedimental
(art. 5º, inciso I, CRFB) e da
proteção do meio ambiente (art. 225 CRFB), considerada a posição de
centralidade que esses preceitos fundamentais assumem no desenho institucional
da Constituição, mostra-se passível
de desfigurar a identidade e estrutura do constitucionalismo pátrio
(grifo nosso).
e que medidas governamentais ou não, que “obstaculizam, quando não impedem, as
reais oportunidades de participação social na arena decisória ambiental”,
levam a “um déficit democrático,
procedimental e qualitativo, irrecuperável.” (grifo nosso); e
Assim, a “boiada esta passando”, não só no Ministério do
Meio Ambiente (MMA), mas também aqui, parecem que as “porteiras foram abertas”.
Diante desse cenário preocupante e inédito desde sua
reestruturação em 1994, o CEA, entidades conselheiras do COMPAM e o FDAM estão
buscando medidas politicas e legais cabíveis para que sejam realizadas tantas
reuniões extraordinárias quanto possíveis para tentar diminuir esse inconstitucional
déficit democrático, materializado na ausência das reuniões ordinárias e de
decisões que tratem do objetivo precípuo do COMPAM e da SQA: a proteção
ambiental.
O CEA estuda medidas a serem adotadas junto ao Conselho
Estadual do Meio Ambiente (CONSEMA), Ministério Publico e ao Poder Judiciário.
Mais em: http://ongcea.blogspot.com/search/label/COMPAM e https://centrodeestudosambientais.wordpress.com/?s=compam
Composição do COMPAM em 2014. Sede da SQA, na rua Professor Araújo. Foto:CEA.
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