A atual definição legal de Área de Preservação Permanente – APP estabelece ser uma “área protegida, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas.”
As APPs, fundamentais para a qualidade ambiental e proteção social das cidades e seus habitantes, com suas diversas funções ecológicas e sociais, já estudadas e comprovadas cientificamente, vem sofrendo, há décadas, forte ataques, seja no plano formal (desregulamentação, flexibilização, desproteção...) e, sobretudo, na pratica, notadamente pela especulação imobiliária, com anuência do Poder Publico, notadamente pelos governos neoliberais.
Os ataques mais atuais são, no plano nacional, os PLs 2510/2019 e 1869/2021, entre mais 13 PLs que visam mudar as regras de proteção das APPs.
A proteção das APPs deveria ser ampliada, mas, ao contrário, no governo Bolsonaro, marcado pelo negacionismo, pelo ataque a Ciência e aos mais variados cuidados ambientais, o capital especulativo e o agronegócio encontraram condições, ainda mais favoráveis, para destruir a Politica Nacional de Meio Ambiente (PNMA), justamente nesse ano que sua lei completa 40 anos.
As APPS “melhoram o clima dos centros urbanos, pela diminuição da
temperatura do ar e das superfícies e aumento da umidade atmosférica; colaboram
na preservação da biodiversidade; auxiliam na proteção e manutenção da
quantidade e qualidade dos recursos hídricos e melhoram muitos indicadores de
saúde da população” e favorecem a mitigação dos efeitos desastrosos dos eventos
extremos” (...) “e, portanto, salvam vidas” (https://www.oeco.org.br/analises/a-reducao-das-areas-protegidas-urbanas-e-uma-ameaca-as-nossas-cidades/?fbclid=IwAR3Rj2ZKR_Ny-TFNsFIcz1ofgn_CAEv--8zXlBuC9CnRqXxm_gf3tsjwPjg).
Proteger a vegetação das APPs é proteger a vida não humana e humana.
Essa importância das APPs é reconhecida pela legislação ambiental federal (como a Lei nº 12.651/12, chamada de Lei de Proteção da Vegetação Nativa ou Código Florestal), estadual (como o precarizado Código Estadual de Meio Ambiente – CEMA) e municipal (como os Planos Diretores).
O PL 2510/2019, que possivelmente
entrará hoje em votação na Câmara Federal, cujo autor é o Dep. Rogério Peninha
Mendonça (MDB-SC), assim como o PL 1869/2021, no Senado, de autoria do Sen.
Jorginho Mello (PL-SC), atacam frontalmente as funções paisagísticas e, sobretudo,
ecológicas e sociais das APPs nas cidades.
Contudo, o PL 2510/2019, visa
transferir para os municípios o poder de definir e regulamentar a largura das
faixas marginais de quaisquer cursos de água, mas sem impor padrões e/ou limites
mínimos, como já aconteceu aqui, no Pampa, em Rio Grande e Pelotas, não sem
grande conflitos por permitir degradação de ecossistemas, como os de dunas e banhados.
Já o PL 1869/2021, altera o
marco temporal das APPs. Hoje, apenas as áreas ocupadas até 22 de julho de 2008
podem ser regularizadas. Após 2008, as regras de proteção das APPS devem ser observadas.
Contudo, o PL em questão, altera tal marco temporal para data da eventual
publicação da lei em discussão, anistiando mais 13 anos de ilegalidades e crimes
ambientais decorrentes do descumprimento da Lei. É um premio ao poluidor, ao
degradador, aos criminosos ambientais, assim como a PEC da grilagem. Se trata
de uma verdadeira anistia aos infratores ambientais, indevidamente concedida
pela lei de 2012. Indevida, porque essas áreas já eram protegias por lei desse a
década de 1930, mas mesmo assim foram ocupadas, contrariando a lei. É uma espécie
de grilagem urbana, com altos impactos ambientais e sociais, legalizada pela
força do capital, traduzida nos votos dos parlamentares, assim como assistimos
no parlamento gaúcho e nas Câmaras.
O PL ainda inverte o ônus da
prova. Hoje, aquele q ocupa a APP deve justificar a ocupação como interesse
público. Se o PL for aprovado, o Poder Público, ou seja o munícipio, quem
deverá fazer, caso a caso, a comprovação de que determinada APP não deve ser destruída.
Além disso, não impõe limite de tempo para a observância das regras, permitindo
novos desmatamentos em APPs urbanas, observado apenas os limites a serem
determinados pelos municípios, que pode ser nenhum.
Tudo isso, além de claramente inconstitucional, entre outros motivos, pela retirada da legal proteção das APPs e por promoverem ataques claros ao constitucional ambiente sadio e ecologicamente equilibrado, leva a uma brutal insegurança jurídica, que chegarão possivelmente no Judiciário, como foi a que ocasionou a decisão de maio desse ano, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em ação que pretendia a não aplicação do Código Florestal em zona urbana. “Segundo o relator, ministro Benedito Gonçalves, a definição pela incidência do código leva em consideração a melhor e mais eficaz proteção ao meio ambiente, como dispõe o artigo 225 da Constituição Federal, observando o princípio do desenvolvimento sustentável (artigo 170, VI) e as funções social e ecológica da propriedade. A tese fixada no julgamento foi a seguinte: "Na vigência do novo Código Florestal (Lei 12.651/2012), a extensão não edificável nas Áreas de Preservação Permanente (APPs) de qualquer curso d'água, perene ou intermitente, em trechos caracterizados como área urbana consolidada, deve respeitar o que disciplinado pelo seu artigo 4º, caput, inciso I, alíneas 'a', 'b', 'c', 'd' e 'e', a fim de assegurar a mais ampla garantia ambiental a esses espaços territoriais especialmente protegidos e, por conseguinte, à coletividade".”
Diante de mais essas ameaças dos PLs, que configuram retrocesso ambiental, diversas instituições (como o CEA), militantes, especialistas, cientistas elaboraram uma Nota Técnica sobre o PL 2.510/2019 (Câmara dos Deputados) e PL 1.869/2021 (Senado), que tratam das Áreas de Preservação Permanente (APPs) em zonas urbanas.
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